COMO VIVE A POPULAÇÃO CARCERARIA EM CADEIAS E PENITENCIÁRIAS DO BRASIL
A vida da população LGBTQIA+ nas prisões brasileiras é marcada por altos níveis de vulnerabilidade, violência e discriminação. Embora representem uma minoria (cerca de 1,4% da população carcerária), essas pessoas enfrentam desafios únicos e muitas vezes brutais.
Em muitos presídios, especialmente os controlados por facções como o PCC, há regras informais que isolam pessoas LGBTQIA+: elas podem ter utensílios separados e, em alguns casos, são proibidas de interagir com outros presos. Mulheres trans, por exemplo, frequentemente são mantidas em presídios masculinos, onde sofrem violência física, sexual e psicológica, além de não terem acesso a tratamento hormonal ou ao reconhecimento de sua identidade de gênero.Apesar disso, há avanços. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou uma resolução que garante que pessoas LGBTQIA+ possam cumprir pena em unidades compatíveis com sua identidade de gênero, com base na autodeclaração. No entanto, essa medida ainda enfrenta obstáculos práticos: apenas cerca de 3% das unidades prisionais possuem alas específicas para essa população.
Estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Paraíba têm se destacado por criar celas ou alas exclusivas para pessoas LGBTQIA+, como no Presídio do Roger, na Paraíba, que oferece banho de sol em horários diferenciados para evitar agressões.
Se quiser, posso te mostrar dados mais recentes ou explorar como organizações de direitos humanos estão atuando nesse cenário. Quer seguir por esse caminho?
Como as leis brasileiras afetam a população LGBTQIA+ nas prisões?
As leis brasileiras oferecem proteções constitucionais e legais à população LGBTQIA+, inclusive no sistema prisional, mas a aplicação prática ainda enfrenta muitos desafios.
A Constituição Federal de 1988 garante igualdade de direitos a todos, sem distinção de qualquer natureza. Com base nisso, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em 2019, que a LGBTfobia deve ser tratada como crime de racismo, o que fortalece a proteção legal contra discriminação e violência.
Além disso, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou a Resolução nº 348/2020, que determina que pessoas LGBTQIA+ privadas de liberdade devem ser ouvidas sobre onde preferem cumprir pena — se em unidades masculinas, femininas ou alas específicas — respeitando sua identidade de gênero e segurança pessoal. Essa resolução também orienta o uso do nome social e o acesso à hormonioterapia para pessoas trans.
No entanto, a realidade nas prisões nem sempre reflete essas garantias. Muitas unidades não têm estrutura para aplicar essas normas, e a falta de capacitação de agentes penitenciários pode levar à negligência ou até à violação de direitos.
Se quiser, posso te mostrar exemplos de boas práticas em alguns estados ou explorar como essas leis são fiscalizadas. Quer seguir por esse caminho?
Quais são os desafios na implementação dessas leis?
Francisco, os desafios são muitos — e vão desde questões estruturais até resistências culturais dentro e fora do sistema prisional. Aqui estão alguns dos principais obstáculos:
Falta de infraestrutura adequada: A maioria dos presídios brasileiros não possui alas específicas para pessoas LGBTQIA+, o que dificulta o cumprimento da Resolução nº 348/2020 do CNJ. Isso expõe essas pessoas a riscos constantes de violência física e sexual.
Resistência institucional e cultural: Muitos agentes penitenciários não recebem treinamento sobre diversidade sexual e identidade de gênero. Isso pode levar à negligência, desrespeito ao nome social e até à revitimização das pessoas LGBTQIA+ privadas de liberdade.
Domínio de facções e regras paralelas: Em presídios controlados por facções, como o PCC, há códigos internos que impõem isolamento e discriminação à população LGBTQIA+. Em alguns casos, elas não podem nem conversar com outros presos ou usar os mesmos utensílios.
Falta de fiscalização e monitoramento: Mesmo com leis e resoluções em vigor, a ausência de mecanismos eficazes de fiscalização dificulta a implementação real dessas normas. O Ministério Público tem buscado atuar de forma mais resolutiva, mas ainda enfrenta limitações.
Desigualdade regional: Estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Paraíba têm avançado na criação de alas específicas, mas em muitas regiões do país essas iniciativas ainda são inexistentes.
Se quiser, posso te mostrar como algumas dessas boas práticas estão sendo aplicadas ou como a sociedade civil tem pressionado por mudanças. Quer seguir por aí?
Quais são alguns exemplos de boas práticas na implementação dessas leis?
Ótima pergunta, Francisco. Apesar dos desafios, algumas iniciativas têm se destacado como boas práticas na proteção da população LGBTQIA+ nas prisões brasileiras:
Manual do CNJ para o Judiciário: O Conselho Nacional de Justiça lançou um manual inédito com orientações detalhadas para magistrados e magistradas aplicarem a Resolução nº 348/2020. Ele inclui diretrizes sobre o uso do nome social, acesso à hormonioterapia, definição do local de cumprimento da pena com base na identidade de gênero, e atendimento psicológico e psiquiátrico.
Apoio multidisciplinar: O manual também recomenda que equipes técnicas (psicólogos, assistentes sociais, médicos) estejam envolvidas em todas as fases do processo judicial e de execução penal, garantindo suporte adequado às necessidades específicas dessa população.
Cadastro de unidades inclusivas: Os tribunais devem manter registros atualizados sobre presídios que possuem alas ou celas específicas para pessoas LGBTQIA+, facilitando decisões judiciais mais seguras e respeitosas.
Proibição de práticas discriminatórias: O CNJ reforça que é vedada qualquer imposição que busque “adequar” a aparência de pessoas LGBTQIA+, como cortes de cabelo ou uniformes que não correspondam ao gênero com o qual se identificam.
Acesso a direitos básicos: O manual também orienta sobre o acesso à educação, trabalho, assistência religiosa e cuidados durante a pandemia, sempre respeitando a dignidade e a autodeterminação da pessoa presa.
Se quiser, posso te mostrar como essas práticas estão sendo aplicadas em estados específicos ou como a sociedade civil tem monitorado sua eficácia. Quer explorar isso?
Quais resultados têm sido observados com a implementação dessas práticas?
Francisco, os resultados ainda são mistos — há avanços importantes, mas também muitas lacunas. Segundo o Relatório Nacional de Inspeções: População LGBTI+ privada de liberdade no Brasil, lançado pela ONG Somos em 2023, algumas melhorias foram observadas, mas persistem violações graves.
Avanços observados:
- Capacitação de profissionais: Mais de 8 mil agentes do sistema prisional já passaram por formações em gênero e sexualidade, o que tem contribuído para um ambiente um pouco mais respeitoso em algumas unidades.
- Criação de celas específicas: Em 106 das 1.499 unidades prisionais brasileiras, há pelo menos uma cela designada para pessoas LGBTQIA+. Isso tem ajudado a reduzir casos de violência direta.
- Afirmação identitária: Algumas unidades passaram a respeitar o uso do nome social, o direito à hormonioterapia e à manutenção de características como cabelo e vestimenta, o que fortalece a dignidade e autoestima das pessoas presas.
Desafios persistentes:
- Violência e maus-tratos ainda são frequentes, incluindo assédio, fome e anulação de identidades.
- Falta de estrutura e fiscalização: Muitas resoluções, como a nº 348/2020 do CNJ, não são plenamente aplicadas por falta de recursos ou vontade política.
- Desigualdade regional: Enquanto alguns estados avançam, outros sequer iniciaram a implementação de práticas inclusivas.
Se quiser, posso te mostrar como esses dados se refletem em histórias reais ou explorar o impacto psicológico dessas práticas. O que você prefere?
Qual é o impacto psicológico dessas práticas?
O impacto psicológico das práticas inclusivas — ou da ausência delas — sobre pessoas LGBTQIA+ privadas de liberdade no Brasil é profundo e multifacetado.
Quando as práticas são respeitadas, como o uso do nome social, acesso à hormonioterapia e alocação em celas específicas, os efeitos positivos incluem:
- Redução da ansiedade e do medo constante de violência.
- Fortalecimento da autoestima e da identidade de gênero, especialmente para pessoas trans.
- Melhor adesão a tratamentos de saúde mental e física, já que o ambiente se torna menos hostil.
Por outro lado, a negligência ou violação dessas práticas pode gerar:
- Transtornos de ansiedade, depressão e estresse pós-traumático, como relatado no Relatório Nacional de Inspeções da ONG Somos.
- Sensação de apagamento identitário, quando a pessoa é forçada a se apresentar de forma contrária à sua identidade de gênero.
- Isolamento social extremo, que pode levar à automutilação ou ideação suicida.
O relatório também destaca que a ausência de itens básicos de higiene, o assédio constante e a falta de acesso à saúde mental agravam ainda mais o sofrimento psicológico dessa população.
Se quiser, posso te mostrar relatos reais de pessoas que passaram por essas experiências ou explorar como o apoio psicológico tem sido estruturado em algumas unidades. O que te interessa mais?